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A imprescindibilidade da intimação pessoal anterior à extinção do processo

Inicialmente, cumpre destacar que o art. 485, do Código de Processo Civil, dispõe as hipóteses em que o Juízo não resolverá o mérito da demanda. Mais especificamente, em seu §1º, há a exposição de que será necessária prévia intimação pessoal nos casos dos incisos II, e III, os quais correspondem aos casos em que o processo ficar paralisado por mais de 01 (um) ano por negligência das partes ou quando houver abandono da causa por mais de 30 (trinta) dias.

Contudo, em que pese o artigo supracitado seja claro ao dispor que, nestes casos, devem haver a intimação pessoal prévia, alguns Juízos e, até mesmo, alguns Tribunais vêm adotando um posicionamento totalmente contrário ao Código de Processo Civil, demonstrando uma clara violação à Lei federal, bem como ao Princípio da Vedação à Decisão Surpresa, o que gera, inclusive, divergência entre teses jurídicas sobre um mesmo dispositivo legal.

Diante disso, tendo em vista o dissídio jurisprudencial existente, torna-se viável a interposição de Recurso Especial para os casos em que a extinção prematura não foi reformada em sede de Embargos de Declaração ou Apelação Cível.

Ora, de fato, o art. 10 do CPC/2015 estabelece que o Juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

À luz destas circunstâncias, o Superior Tribunal de Justiça – STJ considera nula a decisão que não observa as garantias da segurança jurídica, do contraditório e do devido processo legal. Isso porque, conforme entendimento consolidado pelo STJ, todas as partes processuais, interessadas no resultado do feito, devem ter efetiva oportunidade de participar do debate a respeito dos fundamentos relevantes para a formação do convencimento do julgador, com fulcro no princípio da vedação à decisão surpresa (arts. 10 e 933, caput, do CPC).

Nesta dicção, o dissídio jurisprudencial é evidente em virtude de o próprio STJ entender que, nos casos em que há abandono de causa por mais de 30 (trinta) dias, ou nos casos em que há paralisação do processo por 01 (um) ano, torna-se imprescindível à intimação prévia, ratificando o posicionamento do art. 485, §1º do CPC.

Neste sentido, têm-se os acórdãos paradigmas:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 489 E 1.022 DO CPC/2015 NÃO EVIDENCIADA. EXTINÇÃO DO FEITO POR ABANDONO DA CAUSA. CASSAÇÃO DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PESSOAL. NECESSIDADE. EXEGESE DO ART. 485, § 1º, DO CPC/2015. DECISÃO DE ACORDO COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Não ficou demonstrada a alegada ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015, uma vez que o Tribunal de origem, embora sem examinar individualmente cada um dos argumentos suscitados pela recorrente, adotou fundamentação contrária à pretensão da parte, suficiente para decidir integralmente a controvérsia. 2. "O abandono da causa pressupõe a desídia do demandante, que deixa de praticar ou cumprir diligências indispensáveis ao andamento do processo por prazo superior a 30 dias, sendo necessária, nos termos do art. 485, § 1º, do CPC, a intimação pessoal da parte para suprir a falta no prazo de 5 dias" ( AgInt nos EDcl no REsp 1.947.990/SP, R elator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 25/4/2022, DJe de 27/4/2022). 3. Estando a decisão de acordo com a jurisprudência desta Corte, o recurso especial encontra óbice na Súmula 83/STJ. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 2150679 DF 2022/0181672-8, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 20/03/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 31/03/2023)

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA. EXTINÇÃO DO PROCESSO POR ABANDONO. REQUERIMENTO DA PARTE RÉ E INTIMAÇÃO PESSOAL DA PARTE AUTORA. NECESSIDADE. INTIMAÇÃO PESSOAL REALIZADA PELA SECRETARIA DO JUÍZO. AUSÊNCIA DE CONTEÚDO DECISÓRIO. ATO MERAMENTE ORDINATÓRIO. DELEGAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Ação de execução por quantia certa ajuizada em 15/12/2003, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 27/04/2021 e atribuído ao gabinete em 13/12/2021. 2. O propósito recursal consiste em dizer sobre a possibilidade de a Secretaria do Juízo realizar, por delegação, a intimação pessoal da parte autora para dar andamento ao processo sob pena de extinção por abandono. 3. De acordo com a jurisprudência do STJ, a extinção do processo em decorrência do abandono da causa pelo autor somente poderá ser decretada se houver requerimento do réu, na hipótese em que a relação processual já tiver sido integralizada (Súmula 240/STJ), e se a parte autora, intimada pessoalmente, deixar de se manifestar sobre o prosseguimento do processo no prazo de cinco dias (art. 485, III e § 1º, do CPC/2015). Precedentes. 4. O art. 93, XIV, da CF/1988, acrescentado pela Emenda Constitucional nº 45/2004, autoriza que sejam delegados aos servidores a prática de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório, permitindo, dessa maneira, a desburocratização de serviços meramente ordinatórios do processo, em observância ao princípio constitucional da celeridade processual. Nesse mesmo sentido, preceituam os arts. 152, VI e § 1º, e 203, § 4º, do CPC/2015. 5. O STJ já se posicionou no sentido de que "não há que falar em nulidade da delegação aos serventuários de justiça da prática de atos ordinatórios ou de mero expediente" ( AgRg no AREsp 480.543/RJ, 4a Turma, DJe de 14/09/2016). 6. A intimação pessoal da parte autora para dar andamento ao processo, no prazo de cinco dias, sob pena de extinção sem resolução de mérito, trata-se de consectário legal da norma contida no art. 485, § 1º, do CPC/2015. 7. A referida intimação se revela, portanto, como despacho de mero expediente e, assim, passível de delegação aos serventuários de justiça, porquanto, além de ser desprovida de conteúdo decisório, visando apenas dar andamento ao processo, frise-se, em cumprimento ao procedimento determinado pelo art. 485, § 1º, do CPC/2015, a análise quanto à desídia da parte fica reservada ao juiz, que vai avaliar o efetivo abandono do processo para proferir a sentença de extinção. 8. Hipótese dos autos em que além de ter havido requerimento da parte executada, a exequente foi intimada, não só na pessoa de seus procuradores, como também pessoalmente, ainda que pela Secretaria do Juízo, para dar andamento ao processo, no prazo de cinco dias, sob pena de extinção sem resolução de mérito, tendo se mantido inerte, razão pela qual sobreveio a sentença de extinção por abandono. 9. Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 1.977.579/PR, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 4/10/2022, DJe de 6/10/2022)

Sabe-se, ainda, que o Recurso Especial encontra óbice, principalmente, nas Súmulas 7 e  83, ambas do STJ.

No que tange à Súmula 7, do STJ, a qual expõe que a pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial, cumpre destacar que não é aplicada em virtude de o debate acerca da necessidade da intimação pessoal prévia ser exclusivamente de direito, pois cinge-se o debate em definir se o fato de a demanda ter sido extinta sem prévia intimação pessoal implica em violação ao princípio da vedação à decisão surpresa, haja vista a expressa legislação expondo a necessidade de prévia intimação pessoal, bem como os precedentes no mesmo sentido, não tendo a decisão unipessoal realizado nenhuma incursão no conteúdo fático-probatório dos autos.

Outrossim, em relação ao outro obstáculo comumente utilizado pelos Tribunais para negar o seguimento ao Recurso Especial, tem-se a Súmula 83, também do STJ, a qual dispõe que “Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida”. Todavia, no caso em tela, percebe-se que, em verdade, não há entendimento pacífico de que não deve haver a intimação pessoal nos casos do art. 485, II e III, ambos do CPC. Pelo contrário, o entendimento majoritário é o que segue o que está exposto no art. 485, §1º, do CPC.

Caso haja negativa do tribunal com base na Súmula 83, do STJ, faz-se imperioso utilizar-se da técnica do distinguishing para fins de demonstrar que a jurisprudência colacionada aos autos não corresponde ao caso em tela que o nobre advogado está expondo.

Em suma, o Recurso Especial possui todo o arcabouço jurídico para ser conhecido e provido nos casos em que há extinção do processo sem prévia intimação pessoal em virtude do abandono da causa por mais de 30 (trinta) dias ou em razão da paralisação do processo. Isso porque, não só o art. 485, §1º, do CPC, dispõe ser este o procedimento correto, mas também porque há dissídio jurisprudencial existente sobre o tema.

Ante o exposto, o Recurso Especial poderá ser interposto tanto com fundamento no art. 105, “a”, quanto pela “c” do inciso III da Constituição Federal.

 

Artigo por Júlia Marjorie Lima França, advogada da área de Recuperação de Crédito